sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Diário, eu não tenho diário!


04/11/2011 - Sexta-feira

Simplesmente não entendo porque Ricardo continua insistindo que tenho um diário. Que coisa tola! Eu, justo eu?!

Sabe bem que sou quem bota terror no colégio. Todos me respeitam, admiram e os que ousam me desafiar, levam balde de água fria no final. O Ricardo inclusive. Ah. ele vai ver! Uma hora finalmente provarei que não tenho essa coisa tosca de menininha chorona ou cheia dos coraçõesinhos. Honestamente é coisa de gente fraca! Afinal, se tem um problema duro, resolve! Ou esperam que é tudo fácil? Humph! Quer contar como foi o dia, conta para alguém de sua confiança - até eu tenho! - e se não tiver, meu filho se analise que tem algo errado. E muito! Nos outros ou em você. Se for nos outros, que se dane. Se for em você, muda!

Que coisas óbvias, não é mesmo? É cada uma que me aparece... Qualquer dia eu ainda berro para todo o colégio "Eu não tenho diário, poxa!".

Aliás, você não vai acreditar no aconteceu hoje: acredita que o Ricardo...

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Lolita


O som da flauta era leve como a espuma. Mas... triste.

A menina não sorria em público. Se o fazia sozinha, ninguém sabe. Por mais que transmitisse um som melodioso, exibisse uma beleza invejável com roupas simples e tivesse amplo conhecimento, nada a fazia sorrir. Permanecia séria ou tristonha entre amigos, familiares e estranhos, indiferente à diversão que por ventura surgisse. Quase sempre acompanhada por seu gatinho preto, Klimt, falava pouco mesmo conhecendo uma infinidade de pessoas.

Certo dia, um curioso amigo dela foi questionar à governanta da mesma sobre o singular comportamento da menina. Ela demorou a responder como quem não tivesse certeza de que deveria falar, a expressão preocupada olhando para o chão pensativamente. Quando o garoto ia desistir do assunto, ela o encarou e começou a contar:

 - Califórnia era uma menina doce desde pequena. Sei disso por estar presente na época. Gostava da mãe, de brincar e passear no jardim de nossa mansão. Sempre risonha, alegre, exalando uma áurea brilhante, porém não gostava de praticar flauta. Preferia fazer outras coisas e tocar somente nas aulas semanais. A mãe, no entanto, insistia no contrário e vez ou outra o fazia.

"Quando Califórnia tinha 9 anos, a mãe adoeceu gravemente. Faltando pouco para morrer, ela pediu à filha que lhe tocasse uma última música - gostava de ouví-la tocar, sabe? A menina quis prepará-lhe uma especial às pressas, mas como não sabia as lições bem, demorou. Tragicamente minha senhora morreu pouco antes do projeto terminar.

"Sua amiga toca muito bem agora, praticando sempre e com o coração. A perda da mãe e a culpa que ainda sente, 4 anos depois, pode ser notada a cada minuto, com ou sem a flauta transversal com que o pai a presenteou."

O jovem permaneceu atônito enquanto mirava, pasmado com a história, o rosto triste da governanta. Não esperava... que fosse algo assim. Ele abaixou a cabeça e saiu mudo. A governanta parecia secar lágrimas com um lenço de seda branco.

 - Prometo tentar fazer ela sorrir outra vez. - sussurrou para si mesmo, logo pensando em como era egoísta.

O curioso foi que, em anos, ele foi um dos únicos a querer saber a causa de um comportamento, não se limitando a criticar ou estranhar. E a menina em uma sala daquele mesmo corredor, sem ele saber, sorriu lindamente às suas costas como quem dissesse "Obrigada". A partir daí, algo novo e leve parecia acrescentado às suas músicas. Algo bom.